segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

Projeto prevê confisco de terras que usem milícia armada

O direito à propriedade não é mais importante que o direito à vida ou à sobrevivência. Nem de longe. Ocupar fazendas improdutivas ou que não cumprem sua função social é uma ação legítima dos trabalhadores, mas que não seria necessária se o Estado cumprisse esse dever, obedecendo à Constituição. Portanto, é graças a essa pressão da sociedade civil é que a reforma agrária tem sido realizada no país e que grileiros tem sido descobertos.

Para defender suas terras das ações dos movimentos sociais ou ampliar seus domínios, proprietários de terra de Norte a Sul do país tem criado seus exércitos particulares. Chacinas de sem-terra, indígenas, ribeirinhos, quilombolas são cometidas por esses exércitos, que atuam para extirpar essas ervas daninhas indesejáveis. As milícias não são coisa nova. Mas é revoltante saber que no século 21, latifundiários continuem achando que podem ceifar vidas para manter ou ampliar sua pilhagem.

Para quem reclama (respaldado em centenas de casos deprimentes) que a Câmara dos Deputados não se preocupa com o interesse público e que é guiada apenas por uma agenda de interesse próprio ou de certas elites, a notícia é um alento. Há um projeto de lei tramitando na casa que propõe o confisco de terras onde for comprovada a formação de milícias armadas. A proposta, do deputado federal Ivan Valente (Psol-SP), também inclui o confisco de bens de valor econômico da propriedade, destinando-os para as políticas de segurança pública e à reforma agrária. Armas e munições que seriam encaminhadas às forças armadas.

De acordo com o projeto de lei 1557/2007, milícia armada é "toda associação, organização ou reunião de pessoas armadas, de qualquer forma, paramilitar ou não, inclusive oriunda de empresas de segurança, independente da finalidade ou objetivo". Ele deve ser analisado pelas Comissões de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado, de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural e de Constituição e Justiça e de Cidadania.

A relação carnal que se estabelece entre o patrimônio público e a propriedade privada nas regiões de expansão agrícola é um problema de difícil solução. Muito similar ao que se enraizou com o coronelismo nordestino da Primeira República, o detentor da terra exerce o poder político, seja através de influência econômica, seja através de coerção física. O já tênue limite entre as duas esferas se rompe. Não é raro membros da administração municipal serem, ao mesmo tempo, gerentes de fazendas. Ou policiais serem contratados como jagunços de fazendas.

No ano passado, houve dois casos preocupantes envolvendo formação de milícias.

Em outubro, surgiram notícias de que fazendeiros do Pará estariam formando um caixa para contratar "vigilância particular" com o objetivo de impedir ações que atentassem contra as suas propriedades. A informação foi dada por um deputado federal ligado aos produtores rurais paraenses em reunião da bancada do Pará no Congresso Nacional com a governadora do estado. De acordo com a Comissão Pastoral da Terra, o Pará está entre os estados que possuem os mais altos índices de violência contra trabalhadores rurais e de assassinatos em conflitos agrários do país. Ao mesmo tempo, é campeão em número de libertações de trabalhadores em situação de escravidão.

Movimentos sociais acreditam que, na prática, vigilância particular significa a construção de exércitos particulares para proteger as fazendas reivindicadas para a reforma agrária, em sua maioria griladas, ou seja, roubadas do patrimônio público, improdutivas ou que não cumprem sua função social. Parte dos deputados que estavam na reunião demonstraram indignação perante a informação também afirmando que isso é, na prática, formação de milícias privadas e organização de pistolagem. A ação também se estenderia para Goiás e Tocantins. Não seria a primeira vez (e infelizmente, nem a última) que isso aconteceria.

Em 21 de outubro, Valmir Mota de Oliveira, dirigente do MST, foi assassinado durante ocupação de propriedade da multinacional Syngenta Seeds. De acordo com testemunhas, cerca de 25 homens que vestiam coletes da NF Segurança, contratada pela empresa, desceram de um ônibus e dispararam contra os militantes (outros seis ficaram feridos e um segurança morreu. A empresa de segurança foi indiciada por homicídio e formação de quadrilha no caso).

"A Syngenta assassinou com sua milícia armada um trabalhador rural e deixou mais seis feridos e segue ameaçando a nossa biodiversidade com experimentos transgênicos ilegais. Queremos essa empresa fora do Brasil", afirmou Roberto Baggio, da coordenação nacional da Via Campesina. Em novembro, a Justiça Federal decidiu que as atividades desenvolvidas pela Syngenta em Santa Tereza do Oeste, na área de amortecimento do Parque Nacional do Iguaçu eram ilegais, confirmando multa dada em março de 2006 pelo Ibama. Segundo decisão da juíza Vanessa de Lazzarin Hoffman, a produção de organismos geneticamente modificados em zona de amortecimento de unidade de conservação pela Syngenta desrespeita a lei.

Cadeia para esse povo que mata também é fundamental. Mas creio que atingindo a parte que mais dói no corpo deles – ou seja, o bolso – já teremos reesultados muito bons.
enviada por Sakamoto

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